Anvisa aprova venda de dispositivo para socorrer vítimas de engasgo
A asfixia por objetos ou alimentos é a principal causa de mortes acidentais de crianças no Brasil, segundo a Sociedade Brasileira de Pediatria. Em 2016, fez 800 vítimas no país.
Um dispositivo criado nos Estados Unidos e que acaba de ser aprovado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para ser vendido no Brasil pode ajudar a evitar fatalidades do tipo, tanto em crianças como em adultos.
Batizado de LifeVac, ele suga o que está preso na garganta de volta à boca. O dispositivo permite que qualquer pessoa, sem treinamento prévio, possa socorrer alguém que esteja sufocando em poucos passos. O produto lembra um desentupidor, mas atenção: desentupidores não devem ser usados para esse fim.
No Brasil, o dispositivo será vendido pela Sterifarma Produtos Cirúrgicos, uma empresa com sede em Guarulhos, cidade da região metropolitana de São Paulo, daqui a cerca de quatro meses.
O preço ainda não foi divulgado, mas, nos Estados Unidos, o dispositivo custa em torno de US$ 70 e acompanha duas máscaras, uma infantil e outra adulta. As máscaras são descartáveis, pois pode ser danificada durante o procedimento. Cada unidade custa US$ 5,95. Há ainda um kit escolar com quatro unidades do LifeVac e oito máscaras.
O diretor de vendas da companhia, Marcelo Sanglard, explica que a empresa deseja levar o LifeVac para lugares como restaurantes e escolas.
Foi numa excursão escolar que o menino Lucas Zamora morreu aos 10 anos após ter ficado engasgado ao comer um cachorro-quente em 2017, em Campinas (SP). Apesar da presença de adultos, que o acompanhavam durante uma excursão escolar, não foi possível socorrê-lo até a chegada do SAMU.
De lá para cá, sua mãe, Alessandra Zamora, batalhou para que escolas públicas e privadas e estabelecimentos de recreação infantil fossem obrigados por lei a treinar seus funcionários em primeiros socorros.
A lei 13.722, batizada de Lei Lucas, entrou em vigor em abril de 2019, mas ainda não foi regulamentada.
Na maioria dos casos de sufocamento (com exceção de crianças com menos de um ano), é possível aplicar a manobra de Heimlich: uma pessoa se posiciona atrás da que está sufocando e com as mãos sobre o umbigo da vítima faz pressão para dentro e para cima até que a pessoa cuspa o objeto ou desmaie –nesse caso, deve-se ligar para a emergência.
Para o cardiologista Sérgio Timerman, coordenador de Treinamento em Emergências Cardiovasculares da SBC (Sociedade Brasileira de Cardiologia), a simplicidade do LifeVac será capaz de salvar vidas. Ele conheceu o dispositivo durante um congresso médico nos Estados Unidos e diz ter ficado animado com a possibilidade da comercialização no Brasil.
Zamora também comemorou a aprovação e diz que a venda do LifeVac no Brasil é uma conquista importante. “A manobra para desengasgo [manobra de Heimlich] e a preocupação com primeiros socorros sempre foram muito subestimadas no Brasil. Nós sabemos que em 90% dos casos em que a manobra é aplicada corretamente é possível reverter o engasgo. O LifeVac é um auxílio extra, em especial quando a manobra não funciona. Tudo que puder salvar uma vida é válido”, disse.
Zamora, que criou o Movimento Vai Lucas, um grupo de pessoas que tem como objetivo difundir práticas de primeiros socorros, contou com a ajuda dos deputados federais Ricardo Izar (PP-SP) e Pollyana Gama (PPS-SP) para que o projeto de lei fosse levado ao plenário.
Apesar da rápida tramitação da lei e da norma já estar valendo desde abril deste ano, a medida ainda não foi regulamentada. A assessoria de imprensa da Secretaria de Educação do Estado de São Paul disse à Folha que aguarda a regulamentação do MEC (Ministério da Educação) para se adequar ao texto.
Para que as prefeituras e governos estaduais possam fazer cumprir a lei é necessário que o MEC defina como a medida deve ser aplicada, informando, por exemplo, a porcentagem de funcionários de escolas e estabelecimentos de recreação que devem ser treinados para que uma escola receba o selo de aprovação, batizado de Selo Lucas Begalli Zamora.
A reportagem procurou o MEC para obter informações sobre a regulamentação da Lei Lucas, mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem.