MPF entra com ação para obrigar INSS a fazer concurso; 19 mil cargos estão vagos
O Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública (ACP) contra a União e o INSS a fim de que, em até 45 dias, recrutem temporariamente agentes públicos em número suficiente para suprir as demandas acumuladas há mais de 60 dias no órgão de seguridade social. O conteúdo da ação foi divulgado nessa quinta (1º).
Além do recrutamento de mão-de-obra temporária, o MPF pede que seja realizado concurso para provimento de cargos efetivos vagos e que o INSS seja obrigado a informar mensalmente o tempo de análise dos pedidos recebidos. A ação tem caráter de urgência e por isso deve tramitar com prioridade.
Mais de 19 mil cargos vagos
Conforme dados do próprio governo, em julho de 2019, o quadro de servidores do INSS possuía mais de 19 mil cargos de técnicos e analistas vagos e cerca de 4.721 servidores com direito à aposentadoria. Esse cenário, somado à falta de estrutura física, tem impossibilitado os cidadãos de exercerem seu direito constitucional à seguridade social. Registros do INSS dão conta de que existem milhares de requerimentos com análise pendente fora do prazo legal, alguns com atraso superior a um ano.
Apesar das medidas tecnológicas para facilitar o acesso e o requerimento de benefícios e de outros documentos, como o “Meu INSS” e o teleatendimento 135, as investigações demonstraram que tais condutas não garantiram tempo razoável de análise dos processos. Isso porque os sistemas facilitam os pedidos, mas as análises, concessões ou denegações dependem de servidores.
“Ainda que o teleatendimento 135 e o Meu INSS tenham, em tese, facilitado a formulação de pedidos à autarquia, esta não consegue processar, em prazo minimamente razoável, os requerimentos administrativos desencadeados por essas vias. É que as novidades tecnológicas não dispensam a atuação dos servidores para a análise e a decisão sobre o que foi requerido”, frisam na ação as procuradoras da República Eliana Pires Rocha e Anna Paula Coutinho.
Risco de estafa
As procuradoras relatam que o iminente colapso do órgão de seguridade social não é uma novidade. Em 2013, o TCU, durante uma auditoria operacional, já havia alertado os órgãos competentes do risco de estafa. Na época, o Tribunal de Contas apurou que 26% do quadro já possuía direito de aposentadoria e outros 46% preencheriam as condições para se aposentar até 2017. Além do TCU, o próprio INSS publicou notas técnicas em 2015, 2017 e 2018 relatando a situação precária e dificuldades que a autarquia enfrentava. A CGU também analisou o caso, constando igualmente expressiva demora na conclusão dos processos, mesmo após a implementação do INSS Digital.
A ação alerta que o esvaziamento de funcionários se encaminha para a descontinuidade das atividades prestadas, contrariando a diretriz constitucional que estabelece que os serviços públicos devem ser eficientes, adequados e contínuos. E salienta que “a regularidade dos serviços públicos do INSS é fator decisivo para a prestação de condições mínimas de existência à maioria dos seus beneficiários, devendo, por isso, ser política pública priorizada pelo Administrador”.
Atendimento reduzido
As investigações apontaram que o atendimento presencial vem sendo reduzido paulatinamente, dificultando a população vulnerável e hipossuficiente de obter informações sobre os seus próprios direitos. Isso porque mais da metade dos milhões de beneficiários da Previdência é composta por pessoas pobres e idosas com dificuldades de acesso a sistemas informatizados.
Outra questão destacada é a crescente judicialização das questões previdenciárias. Ao não conseguir acessar os benefícios a que tem direito em tempo razoável, a população se vê obrigada a procurar o Judiciário para a resolução das demandas. Segundo relatório do TCU, em 2016, 57,9% dos novos processos acionados na Justiça Federal tratavam de direito previdenciário. Nesse aspecto, magistrados federais enviaram, em janeiro desse ano, documento ao Ministério Público solicitando intervenção do MPF, a fim de garantir respeito ao processo legal administrativo e à prestação de um serviço público digno.
As procuradoras ponderam que “o deslocamento da pretensão não atendida pelo INSS para o Judiciário implica altos custos. Além de duplicar trabalho já realizado administrativamente, os gastos do processo judicial representam 4 vezes mais que o processo administrativo: enquanto o trâmite de um requerimento administrativo custou, em média, R$ 894,00, um processo judicial de 1ª instância custou R$ 3.734,00”.
O documento chama atenção para a complexidade da questão a ser analisada pelo Judiciário, uma vez que o processo é revestido de natureza impactante e estrutural “não só porque há vários interesses concorrentes em jogo, mas também porque a decisão afetará a esfera jurídica de terceiros”. Nesse sentido, a ação relata inclusive a situação precária e assoberbada a que fica submetido o atual quadro de servidores do INSS.
O MPF sugere a designação de audiência pública em até 30 dias para ouvir pessoas com experiência e conhecimento do tema em discussão, de maneira a subsidiar a decisão do juiz. Requer ainda que durante 24 meses, no mínimo, a autarquia seja obrigada a informar mensalmente o prazo de atendimento das demandas recebidas e que proceda à contratação temporária sempre que, pelo acúmulo de tarefas, a análise ultrapasse o prazo de 45 dias.
Recomendação
Em abril deste ano, o MPF já havia recomendado ao INSS e ao Ministério da Economia que adotassem medidas necessárias para a reposição da força de trabalho na autarquia. O pedido foi negado alegando contenção de despesas na Administração Pública.
As procuradoras sustentam que não há que se falar em contenção de gastos, já que o próprio texto da lei prevê que estão resguardados os custos com reposição de cargos efetivos ou vitalícios decorrentes de aposentadorias, falecimentos, demissões e exonerações.